Gente que Cuenta

Janelas, por Fernando Carmino Marques

 

Ettie May Atril press
Ventanal en Brinkburn Priory, Inglaterra. Fotografía Ettie May

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Há janelas que dão para o saguão de casas, vidas fechadas, onde o sol parece ter medo de perder o brilho que generosamente oferece à mais ínfima das flores. Algumas dão para becos sem alma, entregues à irreverência dos gatos e à urina noctívaga dos bêbados que ao madrugar suspiram por ruas submissas ao deslize das borboletas. Outras, por caprichosa ignorância, dão para árvores abandonadas à poeira lamacenta dos homens e ao desprezo dos dias.

Absortas em infinitos solilóquios do eu, há janelas que são muros tão opacos como o cavalo que uma noite caprichosa (talvez de verão) Ulisses insistiu em oferecer a Troia. E, às vezes, “em magoados fins de dia”, quando o céu parece não ser mais que uma ilusão e já nada se espera que mereça esperar, há frestas, seres, que nos abrem para o silêncio tranquilo da lua e apontam para a luz insegura da madrugada.

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Fernando Carmino Marques é Doutor em letras pela Universidade de Paris IV –Sorbonne. Traduziu e editou o estudo inédito de Pierre Hourcade sobre a poesia de Fernando Pessoa: “A Mais Incerta das Certezas”, “Itinerário Poético de Fernando Pessoa” (Coleção “Ensaios” sobre Fernando Pessoa, “Tinta-da-china”, Lisboa, 2016. É docente convidado na Universidade de Atenas e realiza cursos e palestras em universidades europeias e brasileiras sobre a poesia de Fernando Pessoa e “Como ensinar poesia a quem não gosta de ler”.
Como ficcionista publicou: “Sobre outra coisa ainda” (13 short stories), Coleção LPF 20, X11, Edições esgotadas, Porto 2018; “Neste sonho que sou de mim”, Coleção LPF 20, X1, Edições esgotadas, Porto 2020. Como se de outro ela fosse, Edições esgotadas, Porto 2023
Fotografía: Gabriel Moralez

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