
Encontros no ônibus, 2023
Fonte: www.galeriaatlantica.com/valverde/encontros-no-onibus
Um homem frágil, com seu boné e tudo, embarcou num ônibus urbano no Porto. Seus olhos percorreram os assentos até iluminarem-se ao encontrar um rosto familiar. Sentou-se próximo ao amigo – não colado, mas suficientemente perto para iniciar uma conversa. Há algo encantador na maneira como os portugueses conversam nos ônibus.
Talvez fosse um pouco surdo, pois falava alto, tanto que suas palavras chegavam claramente até onde eu estava, sentado em frente a uma portuguesa cujo semblante revelava desaprovação ao discurso do senhor.
Isso me instigou a perguntar-lhe o motivo da discordância. Ela explicou que aquele senhor parecia acreditar que não precisava ajudar sua mulher em casa. “E o seu homem, ajuda?”, indaguei.
“Ele não seria meu homem se não ajudasse. Tenho três filhos e trabalho o dia inteiro. Adoro quando ele me ajuda, apesar de não estar em casa com frequência.”
“Por que não?”, perguntei.
“Porque ele é brasileiro, capixaba, e tem outra vida lá. Passa alguns meses comigo, o que já é suficiente para mim e para as crianças, que o adoram.”
Ela me contou que o conheceu pela internet, olhos brilhando com a memória do primeiro encontro virtual que atravessou oceanos. No balanço do ônibus do Porto, percebi como os laços humanos se tecem em padrões imprevisíveis, conectando continentes em arranjos que desafiam convenções, mas que, de alguma forma, funcionam perfeitamente para quem os vive.

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