A comédia humana, por Luli Delgado

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Sábado à noite. Uma garotinha chora na entrada do supermercado. Eu olhos para a cara do pai dela, e ele me diz: “É que ela mora com a mãe dela e ultimamente ela está assim”…

Continuo a tomar um café. A máquina quebrou. As meninas que me atendem me contam sobre as reclamações dos clientes, “como se nós mesmos a tivéssemos estragado”.

Na mesa do fundo, um senhor de setenta anos fala, ou melhor, implora, ao celular. “Pensei que poderíamos nos ver… Sei que você está cuidando da sua mãe, mas se puder, por favor, me liga?”

Continuo, na direção oposta vem um casal com um menino de uns quatro anos, correndo pelo corredor frio. A mãe, em jeito de desculpa diz: “A bateria dele fica sempre carregada, e o pior é que não sei onde é que ela desliga”. O pai desse menino me pergunta de onde eu sou e começa a falar comigo em um espanhol ruinzinho, que aprendeu nas praias onde surfava…

Eu compro algumas flores e eles me informam que as arrumam sem nenhum custo adicional. Quando vou procurá-las, a gerente me entrega elas com orgulho e me dá detalhes sobre onde aprendeu a fazer arranjos. Sua satisfação é tão grande que eu preciso ouvi-la. Eu sigo.

A senhora na minha frente na fila, setenta anos, obesa, sem delongas, começa a nos contar que não consegue achar a carteira com os cartões de crédito. “Mas eles estavam aqui”, ela repete, apalpando a área do decote… impossível ajudá-la.

É a minha vez de pagar. Surge uma gritaria no estacionamento. Alguém dando ré amassou o carro de um casal que insiste em chamar a polícia.

Eles discutem sem trégua, os espectadores do circo estão instalados bem na frente do meu carro. O guarda e eu formamos uma equipe de força-tarefa e finalmente conseguimos que a guerra continuasse dois metros mais adiante, liberando meu carro.

Ao chegar em minha casa, Alfredo me pergunta: “E onde você estava?”…. “Na comédia humana, talvez?”

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