Juan voltou a dormir mal. Mário tinha se transformado numa careta grotesca que o acompanhava dia e noite. Ele lia avidamente as páginas policiais para saber se o corpo já havia sido encontrado. Também notou que sua esposa havia deixado de ler as sociais e agora disfarçava seu próprio interesse lendo os obituários.
Muitos dias se passaram sem que se soubesse do Mário, tantos que ela chegou a se perguntar se ele estaria realmente morto. Afinal, ela só o sacudiu algumas vezes e ele não respondeu. Exceto por isso, e aquele fio de baba pendurado no canto da boca, nada mais parecia indicar que ele estava morto. Deu-lhe um pouco de nojo lembrar-se daquele fio de baba. Mas talvez ele não tivesse morrido. Ela tinha ouvido falar que há mortos que acordam mais tarde. Houve até casos em que se viu que os féretros, quando reabertos pareciam ter sido riscados por dentro, como se o finado houvesse querido escapar depois do enterro. Ela começou a gostar da ideia de que Mário ainda não tivesse morrido. Mas, se estivesse vivo porque não ligava para ela? Foi quando lembrou que ela tinha achado corpo dele apenas morno.
Aí veio o telefonema choroso da Adelaide, a ex mulher do Mário. A empregada doméstica tinha achado ele na cama, inchado como uma enorme bola de futebol. Tão inchado estava que para tirá-lo do quarto os bombeiros tiveram que arrancar a moldura da porta. Também não coube no elevador. Ainda inchado os bombeiros o levaram escada abaixo. Foi quando um puto que brincava de bola no corredor gritou, Messi!
Durante a ligação Juan ainda estava na sua nuvem e, lembrando-se de como ela se perfumara para o encontro, quase perguntou à ex pelo fedor do morto inchado; mas com o canto do olho ele viu sua esposa soluçando e achou melhor não perguntar. Caberia à Adelaide organizar o velório, quando a polícia liberasse o corpo. À do Juan só caberia chorar, foi quando ele a ouviu dar um grito de partir o coração.