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O poeta relutante, 2015
Trabalho no Instituto Superior para a Inconsistência Generalizada (ISIG) e gosto. A minha função consiste em aplicar várias horas por semana cuidados paliativos a quem sofre de inconsistência patogénica. São jovens, moçoilas e moçoilos de bigode espevitado, empurrados pelo sistema para o Instituto na expectativa de atenuar o mal que desde cedo vêm padecendo: Inconsistência degenerativa. Relutantes de início, alguns acabam por se habituar àquela rotina, outros vivem a estadia como uma colónia de férias: a maioria suporta-a por castigo. Entre os colegas há menos de meia dúzia por quem sinto aquele sentimento humano a que damos o nome de amizade: é uma confiança serena e muda. Os outros, se involuntariamente nos cruzamos nos frios e extensos corredores baixamos a viseira empunhamos a espada prontos para o confronto rosnado que a hipócrita regra de cortesia impõe.
Como animal esfomeado, nos primeiros meses fiquei agradecido pelo magro, mas real, salário que recebia à hora certa e me permitia supor que iria enfim poder esticar o pescoço e ver um pouco mais longe que a janela do saguão do vizinho. Enganei o emprego e a mim. Não tardei a perceber que tinha por vontade própria entrado no purgatório de ilusões, mas estou agradecido ao Instituto Superior para a Inconsistência Generalizada (ISIG) e apaticamente satisfeito: aprendi a virar as costas ao sonho.
![De costas para o sonho, por Fernando Carmino Marques 2 Captura de Tela 2022 03 03 às 23.55.42](https://www.atril.press/wp-content/uploads/2022/03/Captura-de-Tela-2022-03-03-às-23.55.42-300x288.png)
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