Gente que Cuenta

Passa um andarilho, por Alfredo Behrens

Paul Klee Atril press
Paul Klee,
El circo itinerante, 1940

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Meu querido amigo francês caiu na gargalhada quando lhe contei que descendentes de franceses e italianos se juntaram para acabar dando na minha mãe. Ele me explicou que na França era inédito um camponês se casar com alguém da cidade vizinha, muito menos de outro país.

Mas a vida dá muitas voltas e, apesar de eu ter conhecido várias francesas amigas dele, aquela com quem se casou para sempre foi uma brasileira descendente de africanos que conhecera no Rio de Janeiro.

Como era um sujeito querido, dançava maravilhosamente bem, seus amigos se acostumaram a esperar e aceitar quase tudo dele. Mas casar com uma descendente de africanos foi um pouco demais. Ajudou que os amigos dele não a entendessem e que o casal tenha morado muitos anos longe da França e do Brasil.

Mas o tempo foi passando e a saúde dele foi minguando; o velho Roi du Rock pode em breve vir a morrer em Toronto, acompanhado apenas da mulher de toda a sua vida e do filho que ela lhe deu. Poucos dos amigos que ele deixou ao redor do mundo devem saber que sua corda está prestes a acabar.

A vida moderna também tem disso, te permite viver em muitos lugares, mas quando próximo do fim não há WhatsApp que possa te salvar, muito menos te acompanhar, mas já não tem como voltar atrás. Acho que a história do descendente de franceses se casando com uma descendente de italianos hoje não o faria rir, mas graças a Deus pode-se dizer que ele foi feliz, a maior parte das vezes. O que não é pouco.

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Alfredo Behrens  é doutor pela Universidade de Cambridge, leciona Liderança para as escolas de negócios da FIA em São Paulo.

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