Gente que Cuenta

Portucheque,
por Luli Delgado

Portugueses Atril press
“também legumes muito frescos de todos os tipos, que uma portuguesa enorme se encarregava de vender…”

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      Lembro que na Caracas da minha época existia a modalidade do “portucheque”. Consistia na troca de um cheque por dinheiro ao português na padaria mais próxima de casa ou do escritório.

Ou você simplesmente trocava o cheque com ele como se fosse um caixa de banco, ou comprava o que precisava naquele momento e pagava pela compra mais o dinheiro que precisava.

Outro lugar que frequentávamos e onde havia lusitanos eram as hortas que ficavam passando o povoado El Hatillo, onde você escolhia a alface que queria e eles colhiam para você ali mesmo. Havia também legumes muito frescos de todos os tipos, que uma portuguesa enorme se encarregava de vender. Ceci, que na época era pequena, adorava aquele passeio, porque podia brincar com as crianças da sua idade, correndo pelos campos e se encharcando de barro com os filhos dos quitandeiros. Eram pessoas boas, trabalhadoras e decentes que vieram para o nosso Venezuela porque do outro lado do oceano havia uma ditadura que não os deixava viver em paz.

É provável que esta familiaridade com os portugueses tenha sido o que me fez sentir, logo que cheguei a Lisboa, uma enorme vontade de me mudar para cá. Isso foi há seis anos e nunca nos cansamos de agradecer por termos tido a coragem de fazer isso, embora nossos amigos nos dissessem que era uma loucura.

Aqui basta dizer a alguém que sou venezuelana para que a ligação se estabeleça imediatamente: pessoas que tinham um parente que morava em Caracas, outras que nasceram lá e vieram quando eram jovens, e algumas, que ainda têm alguém que conhecem que ainda mora lá. A Venezuela foi o seu grande sonho e isso é algo que nunca será esquecido.

Aqui conheci duas venezuelanas de quem me tornei grande amiga, Amarilis e Karina, ambas casadas com portugueses. Com uma delas, a Karina, outro dia fui a uma padaria comprar maltas. A proprietária, que nos recebeu no caixa, ficou encantada ao nos ouvir conversar e começou a nos contar onde morava, há quanto tempo haviam retornado e detalhes como esse. Quando estávamos saindo, ele nos disse: “Acabamos de fazer arepas para nós aqui. Vocês querem uma?” Saí de lá com meu presente maravilhoso, embrulhado em um guardanapo e mais uma vez feliz pela vida ter nos trazido até aqui. Os portugueses têm o dom de nos fazer sentir em casa…

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Luli Delgado es periodista venezolana, Master en Artes de Cine y  Video – por The American University, Washington, DC.
Fue Directora Ejecutiva de la Fundación Andrés Mata de El Universal de Caracas, y Gerente del Centro de Documentación de TV Cultura de São Paulo. Es autora de varios libros y crónicas.
delgado.luli@gmail.com

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