Não sei quantos compartem desta sensação. É rara. Em mim aconteceu umas três ou quatro vezes só. Não sei ao certo, porque não é que a cada vez ascenda uma luz com um número e musiquinha de “já ganhou”. Mas quando acontece, a sensação é muito forte.
Te conto. Eu andava pela praça Charles Miller, em São Paulo. A praça é erma, e como quase tudo em São Paulo ela também virou um parking. Na verdade, é um descampado. Atravessar ela a pé é provação, mas, como o lugar não tem obstáculos pode se ver à distância e sem distrações.
Na direção contrária vinha um sujeito com ar sofrido. Atarracado, de braços curtos, maltrapilho, corpo prematuramente encurvado para a frente, olhando para o chão e com passo apressado. Íamos nos aproximando, mas ele não descolava o seu olhar do chão, como se não merecesse olhar para a frente. Nada parecia nos unir salvo andarmos a pé nesse descampado.
Mas, no momento que nossos corpos se cruzavam ele olhou nos meus olhos, e eu nos dele. Nesse momento houve uma comunhão intensa. Durou um instante apenas. Mas senti que tinha feito contato com a alma dele, como se nesse momento eu tivesse me debruçado sobre todas as vidas passadas desse homem, até o momento um desconhecido.
Foi estremecedor. Para mim. Não vou banalizar a coisa te dizendo que nesse momento me senti irmão da humanidade toda. Mas sim senti, como até agora, que pode haver uma outra dimensão povoada de espíritos pairando por aí e que as vezes se abre uma janela que te permite ver além de um corpo. Não sei o que faz com que as vezes se abra uma janela dessas. Já aconteceu contigo?