
(1177-1236)
Há números que me dão arrepios e como era dia 7 preferi deixar para a manhã seguinte o que a mim mesmo tinha prometido (ainda bem que o mim-mesmo raramente se queixa das minhas promessas). Garanto: se não fosse dia 7 tinha finalmente escrito aquela carta que há muito ando para enviar. Sim, uma carta, uma daquelas cartas registradas, com aviso de recepção, que o carteiro entrega, quando ninguém espera. Já desisti de mandar emails porque regressam todos com a mesma indicação “email não reconhecido”. Sim, desta vez iria aconchegar uma a uma todas as palavras que dão cor às minhas ideias tais como são, e não como certos especialistas que desafiam a nossa paciência com palavras dissimuladas ou pintores de telas abstratas que nos deixam desconfiados, cara de idiota pasmada, ao lado de quem de olhar envernizado aponta com o nariz arrebitado para o tamanho da nossa ignorância. Sim. Dizer o que tenho para dizer. Reclamar junto de quem se pode reclamar. Quero saber por que razão o absurdo tomou conta da minha vida, como se fosse uma indispensável companhia. Não sei quem, mas alguém tem me explicar. Tem de haver uma resposta. Ou o absurdo já não é o que era?

Como ficcionista publicou: “Sobre outra coisa ainda” (13 short stories), Coleção LPF 20, X11, Edições esgotadas, Porto 2018; “Neste sonho que sou de mim”, Coleção LPF 20, X1, Edições esgotadas, Porto 2020. Como se de outro ela fosse, Edições esgotadas, Porto 2023
Fotografía: Gabriel Moralez