Ele a agarra pelo pescoço com uma só mão. Seu cenho, franzido, raivoso. Ela, olhar assustado, indignado. Medo.E a empurra para trás. Rapidamente. Sem largar o pescoço dela. Atravessam o palco. Rápido.
Essa violência representa a essência do espetáculo de dança “Punk Como Liberdade Emocional”, idealizado, coreografado, desenho de figurinos e interpretação de Mayara Machado.
Digo “interpretado” pois a carga dramática, extremamente intensa, extrapolou a expressão do corpo pela dança. Medo, raiva, violência, depressão, angústia, agressão, abuso, noiva, mãe foram ingredientes nesse retrato da violência contra a mulher.
Uma violência a que atinge muitas mulheres dentro de seus lares ou nas ruas. Uma violência que se torna silenciosa por aqueles que ainda teimam em negá-la.
Esse espetáculo, mais que uma obra de arte, é um grito, uma obra política pelos direitos das mulheres e seus filhos, vítimas indiretas de tal violência. Um espetáculo rude. Duro. Cortante.
Há uma cortina, um véu, cujas tramas são tão fechadas que mal expõem o que acontece por trás dele. Uma violência que sacode o véu, que emite ruídos. Mas ninguém quer ver. Ninguém quer ouvir.
O espetáculo é autobiográfico. A autora sofreu a opressão dentro de seu lar. Através dele, procura purgar, lavar-se da violência que impregnou sua pele e a marcou indelevelmente.

ricardomarts@yahoo.com.br