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O Véu. A agressão. O grito – Ricardo Martins

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Ele a agarra pelo pescoço com uma só mão.  Seu cenho, franzido, raivoso. Ela, olhar assustado, indignado. Medo.E a empurra para trás. Rapidamente. Sem largar o pescoço dela. Atravessam o palco. Rápido.

Essa violência representa a essência do espetáculo de dança “Punk Como Liberdade Emocional”, idealizado, coreografado, desenho de figurinos e interpretação de Mayara Machado.

Digo “interpretado” pois a carga dramática, extremamente intensa, extrapolou a expressão do corpo pela dança.  Medo, raiva, violência, depressão, angústia, agressão, abuso, noiva, mãe foram ingredientes nesse retrato da violência contra a mulher.

Uma violência a que atinge muitas mulheres dentro de seus lares ou nas ruas. Uma violência que se torna silenciosa por aqueles que ainda teimam em negá-la.

Esse espetáculo, mais que uma obra de arte, é um grito, uma obra política pelos direitos das mulheres e seus filhos, vítimas indiretas de tal violência. Um espetáculo rude. Duro. Cortante.

Há uma cortina, um véu, cujas tramas são tão fechadas que mal expõem o que acontece por trás dele. Uma violência que sacode o véu, que emite ruídos.  Mas ninguém quer ver. Ninguém quer ouvir.

O espetáculo é autobiográfico. A autora sofreu a opressão dentro de seu lar. Através dele, procura purgar, lavar-se da violência que impregnou sua pele e a marcou indelevelmente.

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Ricardo Martins, jornalista e pesquisador, com trabalhos para a Editora Abril, TV Cultura e Fundação Roberto Marinho.
ricardomarts@yahoo.com.br

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