Gente que Cuenta

Princesa tupinambá – Alfredo Behrens

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Heitor dos Prazeres
Carnaval nos Arcos, 1965

Acabado de chegar de Montevidéu ao Rio de Janeiro, não entendia nada. Literalmente nada. Não era só o português que não entendia. Cheguei no Carnaval e caí numa procissão da Banda de Ipanema. Chamo de procissão porque não sabia que nome dar aos dois mil que dançavam atrás de uma banda. A metade quase não tinha roupas e ninguém parecia se importar com
isso. Entre um empurrão e outro avistei uma meio loira. Aproximei-me, sorrimos e
conversamos alguma coisa. Ele era de São Paulo e estava no Rio para o primeiro Carnaval dela. Mal consegui pegar o endereço do lugar onde ela estava hospedada quando outra me agarrou e me deu um beijo que me tirou o fôlego. Quando me virei para a loira, ela havia sumido. Continuei dançando porque estava pegando gosto da coisa e o endereço da loira eu já tinha. Iria buscá-la mais tarde, em Copacabana. Ela me recebeu com frieza. Achei que fosse coisa de paulista, mas não, ela tinha ficado ofendida porque eu tinha beijado a outra enquanto
conversava com ela. Com ares de carioca da gema falei que não levasse a mal, que no Rio de
Janeiro era assim, mas que não se enganasse, que quem me interessava era ela, e a prova era que eu estava na sua porta, enquanto o carnaval ainda corria solto na rua. Deu certo, saímos para dar uma volta e nos conhecemos. Ocirema era o nome dela. Amei ainda mais porque a sonoridade indígena do seu nome tinha a fragância do Sorocabana, o café brasileiro que eu frequentava em Montevidéu. A fantasia acabou quando ele me disse que Ocirema era o nome
de seu pai, lido ao contrário. No dia seguinte foi quarta-feira de cinzas, a índia se perdeu em São Paulo e eu fiquei com aquele ar de fim de festa, entendendo ainda menos do que quando
começou o Carnaval.

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Alfredo Behrens é doutor pela Universidade de Cambridge, leciona Liderança para as escolas de negócios da FIA em São Paulo e IME em Salamanca, e é Presidente do Conselho Estratégico da Universidade Fernando Pessoa, no Porto, onde reside.

Alguns de seus livros podem ser adquiridos na Amazon.

ab@alfredobehrens.com