Gente que Cuenta

Visões perfumadas, por Alfredo Behrens

Maria Vasilyevna Yakunchikova Atril press
Maria Vasilyevna Yakunchikova,
La fragancia, 1894-1895

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      Eu vi o Mandela, ela me disse ontem. Brincando lhe perguntei se foi no ónibus, mas não, foi na torrada dela.

Ela vê rostos em toda a parte, para não dizer onde não há nenhum. Mas ela não está sozinha e, como todo mundo, ela vê rostos, mas não notas. Esses dias, recebi uma foto na Internet de duas mulheres comendo pizza. A mensagem dizia que, se você olhasse a imagem rapidamente, ou com os olhos apertados, ou de cabeça baixo, poderia ver o Keanu Reeves. Até eu, que nunca vejo nada, o vi.

Parece que estamos hiper preparados para ver rostos porque, como somos tribais, precisamos distinguir rapidamente o amigo do inimigo. Essa seria a função da amígdala cerebral, a brecha reptiliana, como é chamada. Parece até que até Carl Sagan disse que o reconhecimento de rostos era essencial para nossa sobrevivência.

Há também aqueles que veem rostos, mas não sabem como associá-los a ninguém. Chamam isso de cegueira facial. São pessoas funcionais, mas socialmente são um desastre. Também correm perigo porque não conseguem diferenciar esposas das amantes.

Se é tão importante reconhecer rostos, o que dizer de pessoas cegas que nunca viram um? É um problema, a ponto de, há mais de uma década, que houve uma pesquisa para desenvolver um aplicativo para reconhecimento facial de interlocutores e para transformar essa informação em uma mensagem sonora discreta para lembrar à pessoa cega quem ela é e o que sabe sobre ela. Talvez um dia alguém desenvolva um aplicativo que permita que as pessoas cegas reconheçam alguém pelo cheiro. Digo isso porque, em Chester, certa vez fiquei entusiasmado com a associação de cheiros a coisas.

Eu estava passeando por um belo jardim em Chester quando, de repente, fui envolvido por fragrâncias fortes, mas ricas. Guiado pelo meu nariz, cheguei a um pequeno recinto dentro do jardim, na porta do qual havia um aviso dizendo que esse jardim de flores perfumadas era uma oferta da cidade de Chester para seus cegos. Aos pés das plantas estava o nome delas em Braille! Uma verdadeira beleza!

Desde então, tenho prestado mais atenção aos perfumes, até mesmo aos perfumes das pessoas. Isso tem me ajudado muito.

Alfredo Behrens Atril press

Alfredo Behrens alcançou o grau de Ph.D. pela Universidade de Cambridge. Ele ensinou Liderança nas melhores escolas de gestão e foi publicado ou premiado por Harvard, Princeton e Stanford. Alfredo tem quatro filhas e, com a sua mulher Luli Delgado, mora no Porto, Portugal, desde 2018. Alguns dos seus livros podem ser adquiridos através da Amazon.
alfredobehrens@gmail.com

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