Para fumar apenas um cigarrinho na calçada, Marta deixou a cozinha onde trabalha e se postou na soleira da entrada do restaurante. Foi justo quando os sinos da igreja começavam a badalar o meio-dia. Marta tem um sorriso luminoso, daqueles que convidam a um bom papo e espetei-lhe:
— “Como foi a sua vida?”
Se Marta fosse homem teria feito uma resenha dos seus êxitos. Mas Marta é muito mulher e escolheu mapear a sua vida afetiva:
— “Casei aos 23 e pouco tempo depois tive o meu único filho, hoje com 18. Fui feliz, mas fiquei viúva apos dez anos de casamento”. Sem deixar de sorrir, e olhando para a rua, a Marta continuou:
— “Tive outras paragens, mas cheguei a pensar, como naquela canção brasileira, que tinham acabado todos os bons homens”. E como uma leve encolhida de ombros, continuou:
— “Até que aquele que frequentava o restaurante e me observava com seu olhar meigo, um dia tomou coragem e me convidou para um cafezinho. Foram muitos cafezinhos até nos juntarmos, e com ele estou até o dia de hoje. Graças a Deus!”
Ainda sorrindo, Marta voltou aos seus afazeres quando o sino da igreja completava sua dúzia de badaladas.
Eu fiquei na calçada com a sensação de que tinha ouvido um belíssimo y fugaz relógio de cuco.